Veja só como o caboclo
Arranja seu precipício,
Vindo morar num cortiço
De uma violenta cidade,
Foi o que aconteceu comigo,
Pois entrei neste castigo,
Por causa da vaidade.
Eu morava lá na roça,
Debaixo de uma palhoça,
Toda cercada de flor.
À noite a minha cabocla
Beijava a minha boca
E eu transbordava de amor.
A lua e o verde da mata
Atravessavam a parede,
Enfeitavam a nossa rede
Com pedacinhos de prata,
E era assim que no ranchinho,
Nós dormia com os filhinhos
Naquelas noites pacatas.
Nós era pobre, é verdade,
Mas aquela tranquilidade
Era o meu contentamento,
Nós retirava da roça
A farinha de mandioca,
O tucupi e a tapioca,
O feijão e o arroz pro sustento.
Eu tinha meu bom cavalo,
Cinco galinhas e um galo,
E no pasto uma vaquinha,
Tinha doze ovelhinhas
Que dava gosto de ver.
Um belo dia a cabocla
Com seu jeito de maluca
Começou a me convencer.
Meu bem, essa é a verdade,
Vamos embora pra cidade,
Melhorar o nosso viver.
Nós vende a nossa palhoça,
Nossos bichinhos e a roça,
E outra vida vamos ter.
Foi aí que um fazendeiro,
Por muito pouco dinheiro,
Comprou a minha felicidade,
E eu parti para a cidade,
Onde vi que a realidade
Foi logo mudando o tom,
A minha cabocla dengosa
Começou a ficar vaidosa,
Pintou o beiço com batom.
A pobre desengonçada
Foi trabalhar de empregada
No motel de uma pensão,
E este caboclo acanhado
Teve o peito atravessado,
Pelo punhal da traição.
Autor
Raimundo Amaral, o poeta da Amazônia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário